Em entrevista à Revista CARAS, Juliana Paes refletiu sobre o fenômeno da série "Pedaço de Mim", da Netflix, que tem alcançado sucesso fora do Brasil.Com mais de 20 anos de êxitos nas novelas brasileiras, Juliana Paes, de 45 anos, alcançou mais um fenômeno, desta vez internacional. Até o fechamento desta edição, o melodrama "Pedaço de Mim" estava há duas semanas no topo das atrações mais vistas em língua não inglesa no ranking mundial da Netflix. Escrita por Angela Chaves e dirigida por Maurício Farias, a série narra a trajetória de Liana, uma mulher que, após ser vítima de violência sexual, se vê grávida de gêmeos de pais diferentes.
A convite da gigante do streaming, Juliana viajou para Los Angeles para conhecer a sede da empresa e visitar pontos icônicos da cidade, como a Sunset Boulevard e o Hotel Roosevelt. Até um outdoor com os dizeres "Desesperados pela visita de Juliana Paes" foi colocado nos céus californianos.
"Estou absolutamente surpresa com a repercussão mundial de 'Pedaço de Mim'. Todo o carinho e atenção que recebi foram uma demonstração de reconhecimento pelo sucesso que a série teve. Estou feliz de representar, com esse trabalho, o potencial da indústria audiovisual brasileira de criar em tantos formatos, de produzir histórias também em séries instigantes e que propõem discussões importantes. Eu fiquei só quatro dias em Los Angeles, mas deu para sentir o envolvimento e o entusiasmo das pessoas com a história de Liana. 'Pedaço de Mim' tem esse poder mobilizador, especialmente no público feminino. Levar nossos cenários e paisagens, nossa lógica nas histórias, nossa cultura e o talento das nossas equipes para tão longe é muito especial!", celebrou a estrela, emocionada com o impacto da série.
A identificação e a conexão com os dramas vividos pela personagem são os trunfos que tornaram "Pedaço de Mim" um sucesso nas redes sociais. "As pessoas querem histórias que nos façam identificar e, ao mesmo tempo, inspirem a redenção de nossas próprias mazelas. O sucesso vem dessa possibilidade da redenção, principalmente quando a gente tem coragem de falar e denunciar, de não se calar diante da violência", disse a artista.
Juliana definiu o processo de produção do seriado como "ritmo de cinema", que levou seis meses exaustivos para ser filmado. "Foi tudo muito trabalhoso e delicado para montar essa personagem. Eu não tinha com o que comparar. Onde estavam minhas referências? Que emoção é essa de estar grávida de gêmeos de pais diferentes? Tudo isso é muito novo. Eu saía exausta depois das cenas. O tempo que eu tinha de descanso não me permitia me recuperar plenamente. Foi um dos trabalhos que mais tive dificuldade de me reabilitar para o dia seguinte", relembrou.
"Todas as pitadas de dor que uma mulher pode viver, a Liana experimentou. O desejo frustrado de ser mãe, ser traída pelo marido, a situação do abuso, que é a parte mais complicada da história dela. Foi sempre a nossa intenção deixar claro como o processo do abuso demora a se concretizar na cabeça de uma mulher. Não é algo simples. Todo mundo julga, questiona, as pessoas demoram para entender. Foi muito importante contar a história com essa sensibilidade", destacou a atriz sobre a narrativa.
Como se colocar na pele de uma mulher que engravida ao mesmo tempo do marido e do abusador? O tema da hiperfecundação heteroparental levantou questionamentos. "Por mais que a gente tente se descolar do personagem, é impossível não trazer as próprias experiências para a vivência deles. Claro que eu imaginei: se um dos meus filhos não fosse fruto do homem que eu amo, será que eu conseguiria amar da mesma forma? Será que, em algum momento, esqueceria completamente da diferença entre os dois? Nada é preto no branco nessa situação. O público deve fazer suas próprias reflexões", opinou.
Engajada, Juliana carrega o título de defensora para a prevenção e a eliminação da violência contra as mulheres da ONU Mulheres Brasil e desabafou sobre a questão feminina. "Ser mulher no Brasil é cansativo. A história da Liana começa em 2006, quando estávamos no início desse debate, e, 18 anos depois, ainda vemos que é necessário continuar falando disso. No Brasil, às vezes, parece que você tem que ficar reiterando o óbvio. Não existem palavras que permitam definir a sensação do que acontece com o corpo de uma mulher abusada – o nojo, a vergonha, a incompreensão e a culpa que a abatem. Esse debate precisa ser tratado como questão de saúde pública e discutido pelas mulheres. A gente precisa de vozes femininas tratando desse assunto. Sinto que fizemos um trabalho muito importante de gerar conversa sobre isso", sugeriu a estrela.
"Essa série é o sonho de qualquer atriz. Existe o zeitgeist de mudança. O debate sobre violência contra a mulher, o machismo, o aborto, tudo isso está sendo falado agora. Não existiria momento melhor para colocar no ar um produto como esse", reforçou Juliana sobre as causas que defende.
Diante de tanto sucesso e repercussão de "Pedaço de Mim" nos quatro cantos do mundo, será que Juliana cogita seguir uma carreira internacional em produções estrangeiras? "Carreira fora do Brasil significa morar fora daqui. E eu nunca consegui digerir isso bem. Não tenho vontade de estar longe da minha família. Tenho vontade de desafios que me estimulem, meu inglês é ótimo, sempre me sugerem buscar essa 'coisa lá fora', mas eu gosto mesmo é de estar aqui", concluiu.